A proposta para compensar a isenção de Imposto de Renda (IR) para quem ganha até R$ 5 mil ao mês é alvo de questionamentos. Muitas pessoas têm alegado uma possível perda de investimentos. Isso porque o texto prevê a tributação de altas rendas e dividendos.
Economistas divergem sobre qual será o impacto dessa medida. Alguns dizem que pode desestimular a entrada de investimentos estrangeiros no país, enquanto outros indicam que haverá seleção melhor do perfil do investidor, que terá que repensar estratégias.
Isenção do IR até R$ 5 mil por mês
- A proposta isenta do Imposto sobre a Renda das Pessoas Físicas (IRPF) quem recebe até R$ 5 mil, um universo de 10 milhões de brasileiros. Se aprovada neste ano, a medida valerá a partir de 2026.
- Hoje, a faixa de isenção é de até R$ 2.824 por mês, mas será atualizada para R$ 3.036. O Ministério da Fazenda calcula um gasto de R$ 5 bilhões, que deve ser compensado no ano seguinte.
- Rendimentos entre R$ 5 mil e R$ 7 mil terão descontos parciais.
- O governo federal estima que a isenção do IR custará quase R$ 27 bilhões aos cofres públicos no próximo ano.
- Para compensar a perda arrecadatória, o projeto determina que quem recebe acima de R$ 600 mil por ano pague um imposto mínimo de contribuição progressiva de até 10%.
A tributação de altas rendas e dividendos
O projeto de lei determina a tributação mínima dos super-ricos para compensar a ampliação da faixa de pessoas isentas a pagar o IR. A proposta visa impor um imposto mínimo de até 10% para quem ganha mais de R$ 50 mil por mês (R$ 600 mil por ano).
A tributação mínima, que será progressiva, deve impactar 141,4 mil pessoas (ou 0,13% dos contribuintes do país). Não serão todos os contribuintes que pagarão os 10%, haverá uma “escadinha” de 0% a 10% sobre as altas rendas.
Com isso, o governo federal espera trazer R$ 25,22 bilhões aos cofres públicos, além de R$ 8,9 bilhões adicionais vindos da taxação de 10% na remessa de dividendos para o exterior (entenda a seguir).
O governo estima cobrir os gastos com a ampliação da faixa de isenção do IRPF 2025 (que passará dos atuais R$ 2.824 para R$ 3.036) e da reforma da renda que, caso aprovada, entrará em vigor a partir do próximo ano.
Ou seja, os R$ 34,12 bilhões compensariam a arrecadação perdida em 2025 e 2026.
#ATENÇÃO: a medida não cria um novo tributo, sequer aumenta a alíquota geral do Imposto de Renda. A proposta visa fazer com que pessoas com altos rendimentos, e que não pagavam impostos, passem a contribuir proporcionalmente.
A proposta ainda prevê a retenção na fonte de 10% dos dividendos — isto significa a distribuição de lucros feita pelas empresas aos acionistas — para o exterior (a não residentes), sobre qualquer valor. Para os brasileiros, a conta é diferente.
No caso de residentes no Brasil, a retenção do imposto mínimo de 10% incidirá apenas sobre dividendos pagos para pessoas físicas com rendimento superior a R$ 50 mil por mês.
A tributação conjunta da empresa e de quem recebe dividendo não pode ultrapassar 34%. Isto é, no somatório entre dividendos pagos pelas pessoas jurídicas e físicas, o imposto mínimo não pode ficar acima de 34%, caso aconteça, será reduzido.
Brasil continuará atrativo para investimentos?
Uma das preocupações da tributação de dividendos para não residentes é que atrapalhe a entrada de capital estrangeiro no país. O secretário de Reformas Econômicas do Ministério da Fazenda, Marcos Pinto, afirmou que a equipe não antecipa “problemas” com essa medida.
Em almoço promovido pela Frente Parlamentar do Empreendedorismo (FPE), o secretário disse que estava “muito preocupado” com a possibilidade de ocorrer um afastamento de investimentos estrangeiros.
“Acho que a reação que a gente teve na Bolsa de Valores confirma a minha tranquilidade em relação ao assunto”, ponderou. “A gente está muito tranquilo. E a gente não antecipa grandes problemas nisso”, completou Pinto.
O secretário prosseguiu: “As alíquotas efetivas brasileiras são muito mais baixas que a média internacional. Mesmo com essa alíquota efetiva mais baixa que a média internacional, a gente isenta dividendos, quando na maioria dos países se tributa dividendos”.
Para Carlos Braga Monteiro, CEO do Grupo Studio, a taxação dos dividendos pode gerar um “efeito moderadamente desestimulante” sobre os investimentos no Brasil, em especial, nos setores de infraestrutura e energia, que dependem de capital intensivo.
Ele acredita que a medida pode alterar a dinâmica de distribuição de lucros, o que pode estimular reinvestimentos.
“Embora não devamos esperar uma fuga em massa de capitais, investidores mais sensíveis ao retorno líquido podem considerar realocar recursos para países com regimes tributários mais atrativos”, analisa Monteiro.
Pedro Ros, CEO da Referência Capital, vê a proposta como um “alinhamento a práticas internacionais”. Porém, destaca que a medida compensatória traz preocupações sobre o impacto no ambiente de negócios no país.
“A medida exige cuidado para não comprometer a competitividade dos ativos brasileiros”, afirma. “O equilíbrio entre justiça fiscal e estímulo ao investimento será determinante para o sucesso da reforma”, reforça Ros.
Ele alerta para uma possível perda de atratividade de setores como bancário, elétrico, de seguros e telecomunicações. Além disso, Ros diz que é “plausível” uma migração de capitais para países com estruturas “mais eficientes de tributação sobre renda passiva”.
João Kepler, CEO da Equity Group, entende que a tributação dos dividendos não desestimula o investimento, mas seleciona o melhor perfil do investidor. Segundo ele, o Brasil precisa equilibrar segurança jurídica, previsibilidade e ambiente pró-empreendedor para continuar atrativo para a entrada de investimentos estrangeiros.
Para Kepler, o risco real não é a tributação em si, mas a falta de uma visão estratégica integrada.
“Setores estratégicos só serão afetados se o capital não enxergar horizonte de crescimento claro. Para o investidor, o movimento inteligente agora é diversificação, estruturação patrimonial e reinvenção de estratégias”, declara.
Na mesma linha, Theo Braga, CEO da SME, avalia que a tributação dos dividendos será um fator que obrigará os investidores a repensarem estratégias. Ele ressalta que o “grande desafio” é manter um ambiente econômico estável e previsível.
“Se houver segurança jurídica e incentivos ao crescimento, o capital continuará fluindo. O risco maior é criar um cenário de incerteza, que pode afastar investimentos de longo prazo e enfraquecer setores estratégicos”, finaliza.