A freira brasileira Aline Pereira Ghammachi, de 41 anos, foi destituída do cargo de madre-abadessa do Mosteiro San Giacomo di Veglia, localizado na região do Vêneto, norte da Itália, após ser acusada de má-conduta no comando da comunidade religiosa. O afastamento aconteceu no dia 21 de abril deste ano, mesma data da morte do papa Francisco, e se deu após uma investigação conduzida pelo Vaticano a partir de uma denúncia anônima.
Ela se defendeu e disse que teria sido demitida por jovem e “bonita demais”.
No entanto, entre as acusações contra a religiosa, está a de que ela teria puxado os cabelos de uma freira diagnosticada com esquizofrenia, forçando-a a deixar o mosteiro. Aline também é acusada de restringir o acesso das irmãs a acompanhamento espiritual e psiquiátrico, além de concentrar o controle financeiro do convento sem apresentar transparência nas contas. Segundo relatos, ela ainda teria favorecido familiares e maltratado religiosas idosas.
A denúncia foi enviada ao Vaticano em 2023 e levou o Dicastério para a Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica a abrir uma apuração oficial. A comissão responsável pela investigação compareceu ao convento na segunda-feira de Páscoa deste ano para anunciar a destituição. Segundo uma testemunha presente no local, o decreto foi lido, Aline foi deposta e as demais freiras foram orientadas a manter silêncio sobre o caso.
Freira “bonita demais” nega as acusações
Apesar das acusações, Ghammachi contesta a versão apresentada. Ela afirma que não teve acesso aos detalhes da denúncia e que o processo foi conduzido de forma inadequada, durante um período delicado para a Igreja, marcado pela morte do pontífice. Para Aline, o motivo real do afastamento seria outro.
“Fui retirada do cargo por ser bonita demais”, declarou. A religiosa afirma ter ouvido comentários semelhantes de membros da própria Igreja. “É muito bonita para ser freira, muito jovem, bonita para ser abadessa”, relatou, apontando que tais falas, muitas vezes ditas em tom de brincadeira, a constrangeram ao longo da vida religiosa.
Aline apresentou recurso ao Supremo Tribunal da Assinatura Apostólica, a instância máxima da Justiça eclesiástica. Ela afirma que prestou contas de sua administração e que os documentos financeiros do mosteiro, referentes aos últimos cinco anos, foram auditados e aprovados pela própria Igreja.
Quem é a freira
Natural de Macapá (AP), Aline entrou para a vida religiosa aos 15 anos, após concluir o curso de Administração de Empresas. Em 2005, mudou-se para a Itália para seguir a vocação. Foi eleita abadessa em 2018, aos 34 anos, tornando-se a mais jovem a ocupar o cargo em todo o país.
Durante sua gestão, o mosteiro passou por uma série de mudanças. Aline deu início a reformas estruturais e espirituais, eliminou práticas consideradas pseudomísticas e implementou projetos de acolhimento para mulheres vítimas de violência, pessoas autistas e jovens em situação de vulnerabilidade.
A comunidade também passou a investir em iniciativas de autossustentação, como uma horta comunitária, produção de vinhos e cosméticos naturais.
Após o afastamento de Aline, duas postulantes deixaram o convento e cinco freiras apresentaram queixa contra a nova madre comissária, de 81 anos. Segundo a ex-abadessa, a atual liderança tenta “fazer uma lavagem cerebral” nas irmãs, incentivando-as a aceitar o sofrimento e a injustiça.
“Fui alvo de uma campanha de desinformação e ciúmes. Meu compromisso sempre foi com a fé, o trabalho e a verdade”, afirmou Aline em defesa pública. O Vaticano ainda não se pronunciou oficialmente sobre o resultado final do processo.