No dia 21 de abril, o mundo se despediu de Jorge Mario Bergoglio, o papa Francisco, primeiro pontífice latino-americano, símbolo de uma Igreja mais aberta, próxima dos pobres e comprometida com a justiça social. Poucos dias depois, na quinta-feira (8/5), a fumaça branca da Capela Sistina anunciou seu sucessor: Robert Prevost, agora papa Leão XIV.
Nomeado cardeal por Francisco, o novo líder da Igreja Católica é o primeiro pontífice norte-americano da história, e representa não somente continuidade, mas também afinidade pessoal e pastoral com seu antecessor.
Relação construída com confiança mútua
A ligação entre Francisco e Prevost se iniciou muito antes da eleição papal. Em 2014, Francisco reconheceu o trabalho missionário de Prevost no Peru e o nomeou administrador apostólico da Diocese de Chiclayo. A confiança foi reafirmada em 2023, quando o norte-americano foi chamado a Roma para assumir dois dos cargos mais estratégicos da Cúria: prefeito do Dicastério para os Bispos e presidente da Pontifícia Comissão para a América Latina.
Pouco tempo depois, foi elevado ao cardinalato, movimento que muitos já interpretavam como sinal de sua influência e da sintonia com Francisco.
A afinidade pastoral une as retóricas dos dois papas. Francisco e Leão XIV compartilham uma visão eclesial marcada pelo cuidado com os marginalizados, o combate às desigualdades e o enfrentamento da crise climática. Assim como Francisco, Prevost defende uma Igreja acolhedora e envolvida nas dores do mundo.
Ele já demonstrou alinhamento com as principais encíclicas do pontífice argentino, como Laudato si’, que denuncia a destruição ambiental causada por sistemas econômicos predatórios, e Evangelii Gaudium, que propõe uma evangelização voltada para os mais pobres e excluídos.
Em entrevista ao Metrópoles, o reitor do santuário Nossa Senhora da Saúde, padre Rafael Souza, destacou a admiração do novo sucessor de Pedro, Prevost, por Francisco.
“Toda a carreira dele junto à Santa Sé foi feita com o papa Francisco, ele como admirador. Ele deixou muito claro que vai continuar aquilo que o Francisco estava fazendo”.
O lema eclesial de Robert Prevost é “In Illo uno unum” — “Em um só, nós somos um”. A frase, de um sermão de Santo Agostinho, reforça a busca por unidade e comunhão na diversidade da fé cristã. Se aproximando da poética de Francisco, de agregar e viver em unidade.
Perfil missionário
Leão XIV é descrito como afável, moderado a progressista e reservado, traços que podem lembrar o estilo de Francisco, ou ao menos alinhado a sua postura. Com experiência missionária no Peru, somada à fluência em espanhol e à sensibilidade pastoral, reforça sua conexão com a América Latina, região que moldou o pensamento e a atuação de seu antecessor. Inclusive, seu primeiro discurso como papa foi declamado parte em espanhol.
É visto como um homem de escuta, diálogo e conciliação, características cada vez mais valorizadas no Vaticano. Com um perfil conciliador, ele carrega a reputação de conseguir dialogar com diferentes alas na igreja: conservadores e progressistas.
Apesar da sintonia em muitos aspectos, há nuances importantes entre os dois papas. Leão XIV, por exemplo, adota uma abordagem mais conservadora em relação à comunidade LGBTQIA+, contrastando com os sinais de maior abertura dados por Francisco. O novo pontífice tende a ser mais discreto em suas intervenções públicas, preferindo um estilo mais reservado.
Legado de continuidade com identidade própria
A eleição de Leão XIV não deve representar uma ruptura, mas sim uma continuidade adaptada. Sua trajetória, suas nomeações por Francisco e sua visão pastoral indicam que pretende seguir os passos do antecessor, promovendo uma Igreja mais próxima dos pobres, comprometida com a justiça social e aberta ao diálogo.
Ao mesmo tempo, Robert Prevost deve buscar imprimir sua própria identidade no pontificado.
Em seu primeiro discurso, Leão foi firme na retórica: “Serei Francisco”. Ou seja, tranquilizando o coração de fiés apegados a reformas e estilo de seu pontificado.
“Mas o modo de se posicionar nele das coisas, como ele mesmo disse, fazendo menção ao papa Francisco, é que ele vai dar continuidade ao trabalho dele”, afirmou Souza.
O diácono Alexandre Varela, associou Prevost, ao papa Francisco, indicando a sinodalidade pregada pelos dois. O conceito refere-se ao processo de caminhar juntos, fraternamente, visando discernir e tomar decisões importantes para a vida da Igreja.
“O seu lema fala da humildade. É um perfil muito próximo daquilo que os cardeais já queriam. Sinodalidade, igreja unida. Ele fala como Francisco, no quesito construir pontes”, afirmou.
Nomeado cardeal por Francisco, Leão XIV herda seu legado com estilo próprio, marcando continuidade e equilíbrio na liderança da igreja católica.