Robert Prevost, o papa Leão XIV, nascido em Chicago, nos EUA, chegou ao Peru em 1985. Inicialmente a missão era prevista para durar cerca de três anos, mas ele acabou ficando por lá durante 25 dos seus 69 anos. Durante um quarto de século o pontífice viveu no país da América Latina e atuou como missionário, formador, prior e, por fim, bispo.
A expectativa é que Leão XIV leve consigo, ao Vaticano, a bagagem das missões nas periferias, a vivência cotidiana com os mais pobres, a escuta ativa e a liderança que prioriza o acompanhamento pastoral em vez de um comando distante. O que resta saber é se essa experiência será o suficente para lidar com os desafios da Igreja contemporânea.
O papa foi escolhido após dois dias de conclave.
Missões no Peru
Em sua primeira missão, Prevost foi enviado, em 1985, a Chulucanas, uma região marcada pela pobreza e pelo abandono do Estado, como missionário. Além de celebrar missas e visitar comunidades, ele se dedicou a entender o contexto local: os conflitos agrários, o desemprego crônico, a fé popular e o peso da exclusão. “Não era um bispo de batina e distância. Era um irmão que se sentava com a gente”, lembra o padre Javier Mendoza, que foi seu aluno em Trujillo.
Em 1987, Prevost assumiu o papel de formador na cidade de Trujillo, ao liderar o processo de formação de aspirantes agostinianos de Chulucanas, Iquitos e Apurímac. Seu trabalho era uma mistura de evangelização e ensino, com uma abordagem focada no cuidado pastoral, em vez de uma liderança hierárquica e distante. Além de sacerdote e formador, foi lá que ele atuaou como prior, gerenciando a vida comunitária, incentivando a formação contínua dos membros e reforçando seu compromisso com os mais pobres.
Em 2014, a nomeação de Prevost pelo papa Francisco como bispo de Chiclayo marcou uma nova etapa em sua missão no Peru. Foi quando, após anos de idas e vindas entre Chicago e o Peru, ele pediu a cidadania peruana como uma expressão de seu compromisso com o país e sua gente.
Durante a pandemia da Covid-19, em sua atuação como bispo, o agora papa Leão XIV, acompanhado por membros do clero, realizou uma procissão com o Santíssimo Sacramento pelas ruas vazias da cidade, abençoando o povo e oferecendo uma mensagem de esperança, apesar das restrições sanitárias que impossibilitavam as celebrações religiosas tradicionais.
O carinho pelo país e seu povo não ficou de fora de seu primeiro discurso como pontífice, nessa quinta-feira (8/5). Durante a fala à multidão de fiéis que esperavam para o conhecer, Leão XIV quebrou o protocolo de séculos – o anúncio e a primeira fala oficial são inteiramente feitos em italiano ou latim, línguas oficiais do Vaticano – e se dirigiu, em espanhol a sua “querida Diocese”.
“Se me permite também fazer uma saudação, dizer algumas palavras agora em espanhol, em especial a minha querida Diocese, no Peru, onde um povo fiel acompanhou o seu bispo para compartilhar sua fé com ele, e que tanto fez para ser uma Igreja fiel a Jesus Cristo”, declarou o novo papa.
O papado de Leão XIV
Durante a 12ª Congregação Geral, no dia 8 de maio, antes do conclave que escolheu Leão XIV como papa, foram debatidas as reformas na Igreja Católica iniciadas por Francisco que precisam ser levadas adiante, como a luta contra os abusos, a transparência econômica, a reorganização da Cúria, a sinodalidade e o compromisso com a paz.
De acordo com o Vaticano, foi então que surgiu a necessidade de que o perfil do próximo papa fosse de “pastor, mestre de humanidade, capaz de encarnar o rosto de uma Igreja samaritana, próxima das necessidades e das feridas da humanidade. Em tempos marcados por guerra, violência e fortes polarizações, há uma forte necessidade de um guia espiritual que ofereça misericórdia, sinodalidade e esperança”.
A vivência de Leão XIV no Peru aponta, justamente, para um pontificado mais voltado à escuta coletiva e à descentralização de poder. Mas os desafios que o esperam são grandes e refletem os dilemas centrais da Igreja no século 21:
- Reconquistar fiéis: em muitos países, o catolicismo perde espaço para o secularismo e outras religiões. No Brasil, por exemplo, a Igreja pode deixar de ser maioria em poucos anos.
- Formar novos padres: o número de vocações sacerdotais cai ano após ano. A vida celibatária e a formação defasada afastam jovens candidatos.
- Lidar com divisões internas: a tensão entre setores conservadores e reformistas cresce. Manter a unidade sem frear avanços será um teste constante.
- Combater os abusos: a crise dos escândalos sexuais ainda assombra a Igreja. Leão XIV terá que garantir justiça, transparência e novas formas de prevenção.
- Promover a paz: com mais de 50 guerras e conflitos armados em curso no mundo, o papa será pressionado a se posicionar, mediar tensões e renovar o papel pacificador da Igreja no cenário global.
Durante a sua primeira missa como líder da Igreja, nessa sexta-feira (9/5), o papa sinalizou que pretende conduzir a Igreja por caminhos de paz, diálogo e acolhimento. Em suas próprias palavras, a paz surge como um dos pilares centrais de seu pontificado, especialmente em um mundo marcado por guerras e polarizações.
“Somos discípulos de Cristo. O mundo precisa da sua luz, a humanidade precisa dele como ponte entre Deus e o amor. Nos ajudem a construir pontes vocês também, com diálogos, com encontro, para sermos um único povo, sempre em paz. A paz e a justiça são as coisas pelas quais devemos caminhar juntos”, afirmou Leão XIV.