O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, instaurou uma política tarifária intensa desde o dia 1 do seu segundo mandato. O líder, que defende tarifas como solução econômica há mais de 30 anos, criou uma guerra comercial com todo o mundo, e, em especial, com a China. Para entender como essas medidas interferem no direito comercial internacional, o Metrópoles ouviu o especialista em direito tributário Flávio Molinari.
O especialista destaca que, “no direito do comércio internacional, tarifas são ferramentas centrais de intervenção estatal, com potencial de redirecionar fluxos comerciais, afetar cadeias produtivas e reconfigurar estratégias de inserção internacional. Quando aplicadas fora dos parâmetros multilaterais, perdem legitimidade como política econômica e passam a atuar como barreiras geopolíticas”.
O que está acontecendo
- O presidente dos EUA anunciou, no que ele chamou de “Dia da Libertação”, tarifas a 117 países pelo mundo.
- A China foi taxada, inicialmente, em 34% sobre todos os produtos importados pelos EUA.
- Como resposta à taxação, o país oriental anunciou uma tarifa retaliatória de 34% aos EUA.
- Em escalada da guerra tarifária, nessa terça-feira (8/4), a Casa Branca anunciou que aplicará uma tarifa de 104% sobre todos os produtos chineses. Em resposta, a China irá aplicar 84% sobre os produtos importados dos EUA.
- Donald Trump, em uma escalada tarifária, anunciou que imporá uma tarifa recíproca de 245% à China. As tarifas da China de 125% entraram em vigor na quinta (10/4).
- Ao Brasil foram aplicadas tarifas de 25% sobre o aço e o alumínio. 10% de tarifas universais e 10% de tarifas recíprocas.
“Essa distorção atinge diretamente o Brasil, cuja exportação é concentrada em produtos primários e depende de acesso estável e previsível aos grandes mercados internacionais”, destaca Flávio Molinari.
Segundo Molinari, “o tarifaço promovido por grandes economias, como os Estados Unidos, representa uma ameaça direta ao sistema multilateral de comércio estruturado pelo Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (Gatt, na sigla em inglês). Desde 1947, o sistema consolidou princípios como previsibilidade tarifária, transparência e tratamento equitativo entre os membros”.
O especialista ainda destaca que a aplicação unilateral de tarifas, fora das exceções previstas, enfraquece esses fundamentos, “mina a segurança jurídica do comércio internacional e empurra países em desenvolvimento a buscar soluções fora da estrutura multilateral tradicional”.
Brasil com as Tarifas
Flávio Molinari ressalta que, “no contexto brasileiro, o governo sancionou a Lei da Reciprocidade Comercial, autorizando a adoção de medidas comerciais contra países que imponham barreiras unilaterais aos produtos do Brasil. Além disso, o país busca expandir sua rede de acordos comerciais, mantendo negociações com os Estados Unidos e promovendo novos arranjos com países asiáticos, como Japão e Vietnã”.
“Nesse cenário, o Brasil pode enxergar uma janela de oportunidade. A fragilização do multilateralismo abre espaço para acordos bilaterais seletivos que ampliem o acesso a mercados específicos ou reforcem alianças econômicas regionais”, diz.
O desafio seria, segundo o especialista, “aproveitar essas possibilidades de curto prazo sem comprometer o compromisso de longo prazo com uma ordem internacional baseada em regras estáveis, previsíveis e imparciais — fundamento essencial para países com menor poder de barganha no cenário global”.
As perdas do Brasil com a guerra global de tarifas podem somar cerca de US$ 4,980 bilhões, o equivalente a R$ 30 bilhões, segundo o câmbio dessa segunda-feira (14/4). A estimativa foi feita por meio de uma simulação computacional, realizada por economistas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
A análise, realizada por pesquisadores do Núcleo de Estudos em Modelagem Econômica e Ambiental Aplicada (Nemea), da UFMG, mostra que esse seria o impacto geral do conflito tarifário na produção do país. Sob o ponto de vista dos setores que compõem a economia, contudo, o resultado pode variar.