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    Mito do 4K – Por que você não precisa

    Tem gente de olho no nosso rico dinheirinho. E, para atraí-lo, estão bombardeando o mercado com a noção de que 4K é o máximo.

    4K Será? Para piorar, a maioria do que se vende como 4K, hoje em dia, está longe dos verdadeiros 4K que a indústria cinematográfica adotou como padrão de altíssima definição na época da película. Isso explicaremos, com detalhes, na segunda parte deste artigo.

    No entanto, o marketing que rola por aí faz parecer que ter uma câmera 4K é uma verdadeira necessidade, e que aqueles que não tem estão ficando para trás.

    Pior que quem investe nesse equipamento vende-o para os clientes como sendo o máximo, desprezando os concorrentes que não embarcaram nesta onda.

    Os clientes, que normalmente não têm conhecimento técnico suficiente, acabam acreditando nesse mito e um círculo vicioso se forma. O cliente paga caro pelos 4K e acaba com um produto em HD ou, no máximo, 2K.

    Todos envolvidos no processo de produção e pós em 4K gastam muito mais tempo, armazenamento e dinheiro para, no final, entregarem o mesmo produto que seria entregue por quem produz com equipamento 1080p ou 2K.

    Essa história do 4K tomou uma proporção tão grande que até os fabricantes mais responsáveis e tradicionais estão sendo forçados a adotar o formato, mesmo que ele não faça muito sentido. Senão, correm o risco de parecer ultrapassados. Ainda mais em um mercado tão competitivo como o atual.

    Saiamos um pouco do mundo dos sonhos elaborado pelas equipes de marketing e coloquemos os pés no chão. Quem precisa, de verdade, de uma câmera 4K? Quem faz cinema digital? Ironicamente, não existem cinemas com projeção em 4K no momento, e nem existirão tão cedo.

    Aliás, nos Estados Unidos a projeção digital em 2K mal está se firmando no mercado. 2K é o padrão universal atual de projeção cinematográfica de qualidade, que está ainda em fase de implantação mundo afora.

    Significa um investimento pesado que, embora necessário, caminha com certa lentidão. Ou seja, se você acha que filmar em 4K é uma necessidade para produção cinematográfica séria, é melhor pensar duas vezes.

    Até mesmo porque a câmera de cinema digital mais cobiçada e respeitada no momento, a ARRI Alexa, filma em 2K. O que faz todo sentido, já que 2K é o padrão atual de cinema.

    Ah, mas dizem que 4K é o futuro… Sim, só que esse futuro ainda está muito distante e, no momento, é economicamente inviável. Pense só no investimento que está sendo feito em projeção digital em 2K.

    Qualquer modelo de negócio inteligente dita que um investimento deve render o máximo retorno possível. O que significa que esses caríssimos projetores 2K (um projetor Barco 2K custa, em média, 500 mil reais) continuarão sendo o padrão por uns 10 anos ou mais.

    Mas e as TVs 4K que os japoneses estão anunciando? Bem, nos anos 80 o Japão já tinha transmissão de TV em HD. Só recentemente é que essa transmissão está se tornando realidade nos EUA e no Brasil. Mesmo assim, depois de virar digital.

    Lembro que uma produtora de Seattle investiu mais de um milhão de dólares no formato HD analógico pouco antes do formato digital ser lançado. A produtora faliu. Embora HD fosse o futuro, não era bem o tipo de HD em que eles investiram.

    O que nos leva a questionar se os modelos de 4K atuais não terão o mesmo destino e serão tão semelhantes ao 4K do futuro quanto uma lesma é semelhante a um elefante.

    Mas, voltando à TV HD. Só muito recentemente é que os aparelhos de TV Full HD se tornaram um pouco mais acessíveis para o grande público.

    Mesmo assim, a maioria dos consumidores que tem uma TV Full HD em casa, no Brasil, nunca assistiu uma transmissão em HD. Tipicamente assistem ao sinal do cabo digital em SD, mesmo, muitas vezes esticando o material em 4:3 para preencher suas telas 16:9.

    O pior é que muitos não sabem sequer distinguir uma imagem HD de verdade de uma SD.

    Como a TV HD praticamente acaba de ser implementada aqui e nos EUA, você acha que as redes de TV irão, de uma hora para outra, jogar fora todo seu investimento em transmissores e equipamento de produção para adotar o 4K só porque os japoneses estão anunciando TVs com essa resolução? É ruim….

    Pior que uma boa parte da programação, até mesmo da Rede Globo, ainda é originada em SD e, pior ainda, em 4:3.

    Ainda existem outros fatores bem importantes nessa equação. Primeiramente, está cientificamente comprovado que é impossível para uma pessoa normal perceber a diferença entre 720P e 1080P em uma TV de 42″, sentada a uma distância tradicional da tela.

    Até mesmo as TVs maiores, de 60″, apresentam uma diferença que só é percebida de perto. No cinema, não é possível perceber a diferença entre 1080P e 2K, nem nas primeiras filas, pois a diferença de resolução é mínima (128 x 72 pixels). Daí muitos filmes terem sido rodados em 1080P e convertidos para 2K, sem nenhum problema.

    Se não se consegue ver a diferença de 720P para 1080P na maioria das TVs, pois nossa visão perde os detalhes com a distância, então imagine só 4K em uma TV de 50″. Ao preço absurdo que essas TVs custarão, duvido que se tornarão um item de consumo em massa tão cedo.

    Aliás, também já foi comprovado que só mesmo nas primeiras filas de um cinema com o melhor sistema de projeção digital é que alguns poucos membros da platéia conseguem distinguir alguma diferença entre 4K e 2K.

    Ah, mas tem o Bluray… Muita gente tem Bluray para poder tirar os máximo proveito das TVs Full HD!… Não necessariamente. A maioria dos consumidores ainda assiste o bom e velho DVD.

    E, embora o preço dos players Bluray esteja despencando, tornando-os quase tão baratos quanto um player DVD, o formato ainda não se tornou o padrão normal de se assistir filmes em casa – o que deverá mudar com o tempo, sem dúvida.

    Porém, o Bluray é 1080P! Se a resolução da imagem fosse tão importante para o consumidor típico, o DVD tradicional já estaria obsoleto há muito tempo.

    Então, se não há como exibir material em 4K, nem sequer visualizá-lo em sua resolução plena na edição, por que todo esse frenesi? A resposta é simples: marketing.

    Os fabricantes de equipamentos profissionais descobriram a técnica que os fabricantes de automóveis, equipamentos de som, telefones celulares e câmeras fotográficas já utilizam há tempo: Quer aumentar as vendas? Invente um número maior e faça parecer que o número menor não vale mais nada.

    Vamos dar o exemplo de celulares e câmeras fotográficas. Um telefone com uma câmera com resolução de 4 megapixels parece inferior a um com uma câmera de 8 megapixels.

    Afinal, 8 é o dobro de 4! E, se meu colega de trabalho tem um de 8, eu não posso ficar para trás com apenas um de 4. É hora de sacar o cartão de crédito e mostrar que eu tenho o que existe de melhor!

    Só que, o que não se leva em conta em um caso desses, é que uma boa câmera de 4 megapixels gera imagens muito superiores às de uma câmera ruim de 8 megapixels.

    O mesmo acontece na indústria automobilística. Vou lhe fazer uma pergunta bem simples: Juntamos dois carros, um com motor 1.0 e outro com motor 1.6 para ver qual dos dois alcançava os 100 Km/h mais rápido.

    Os dois carros estavam somente com o motorista, sem nenhuma carga extra. Qual dos dois não só foi de 0 a 100 Kh/h mais rápido como também apresentou melhor performance em geral?

    A maioria das pessoas diria que, obviamente, o carro com motor 1.6 apresentou melhor desempenho. Só que, nesse caso, o 1.0 saiu-se bem melhor.

    É que o 1.6 era uma Brasília, enquanto o 1.0 era um modelo de última geração. E, é claro, um motor 1.0 bem desenhado rende bem mais que um 1.6 mal desenhado ou antiquado.

    Foi com o lançamento da primeira RED 4K, cujo dono não é ninguém menos que o dono da Oakley – mestre em vender produtos esportivos por preços altos e, consequentemente, guru de marketing – que esse mito dos 4K teve início.

    E a ironia maior é que a própria RED, para vender mais câmeras como no modelo do mercado comum de consumo, lançou depois um modelo de 5K.

    Isso mesmo, 5K! Agora sua 4K ficou obsoleta! A produtora da esquina tem 5K, portanto os filmes dela serão muito melhores que os seus… Só que 5K nem é um padrão. Nunca existirão TVs ou projetores 5K.

    Não desejamos, de forma alguma, desmerecer as RED, pois são câmeras maravilhosas. Mas os tais dos 4K é que embolam o mercado todo, ainda mais quando levam a crer que são uma necessidade absoluta. Até porque os sensores das RED oferecem uma performance de Brasília quando utilizados em 2K.

    Daí você é praticamente obrigado a filmar em 4K e converter o material para 2K ou 1080. E nisso perde-se tempo, dinheiro e gasta-se uma quantidade muito maior de armazenamento.

    Mas 4K são necessários para projeções em IMAX!… Desculpe, mas nem as projeções em IMAX (filme de 65mm na horizontal) chegam a 4K reais de resolução. Isso mesmo.

    Portanto, uma projeção digital em 4K reais teria, teoricamente, mais resolução que uma projeção IMAX. Agora me responda – quando foi a última vez que você ou um colega seu produziu exclusivamente para IMAX?

    E você sabia que vários filmes digitais exibidos hoje em IMAX foram rodados em 1080?

    Ah, mas produzir em 4K hoje garante que o filme estará pronto para o futuro!… Fail! Porque a única câmera vendida atualmente no mercado capaz de se aproximar de 4K reais é a F65 da Sony. E é por isso que ela tem um sensor de 8K. Como assim? Explicaremos na segunda parte desse artigo.

    Para terminar, vamos citar duas razões para se filmar em 4K, mesmo que seja com uma câmera que não produza 4K verdadeiros. A primeira é para a produção de efeitos visuais.

    É por isso que o diretor Peter Jackson usa 4K e até 5K. Desde os tempos da película, os negativos eram escaneados em 4K (reais) para efeitos visuais por causa da dificuldade de se fazer composições em diversas camadas.

    Principalmente quando havia a necessidade de máscaras e outros tipos de recortes. Nesses casos, a resolução maior ajuda. Mas quantos produtores você conhece, incluindo você mesmo(a), têm um orçamento de dezenas de milhões de dólares só para efeitos visuais?…

    Outro uso frequente dos chamados 4K é o re-enquadramento na pós. Ou seja, o diretor filma só o plano geral e depois os closes são cropados deste plano. Economia de tempo de produção?

    Hitchcock, Truffaut e John Ford deverão estar dando inúmeros giros em seus túmulos só de pensar nessa prática absurda. Afinal, um simples crop não se parece nem um pouco com uma tomada mais próxima, pois a ótica é totalmente diferente. Sem contar que, ao se fazer planos mais próximos, geralmente mudamos o posicionamento da câmera.

    Mas, e se usarmos o 4K para fazer apenas correções de enquadramento na pós? Isso significa que os enquadramentos ficaram errados na filmagem. É muito mais profissional enquadrar bem na filmagem do que deixar para o editor, finalizador ou colorista fazer isso depois.

    Isso acaba custando bem mais caro e tomando mais tempo. Além de que sistemas como o DaVinci Resolve têm qualidade ótica para esse tipo de correções, tornando o processo praticamente imperceptível, mesmo em material originado em 1080.

    Portanto, a não ser que você seja um cineasta preguiçoso e/ou displicente, a única vantagem real de se filmar em 4K (falsos), hoje em dia, tanto para exibição no cinema quanto na TV, é quando seu filme necessita de efeitos visuais complexos e caros.

    John Galt, vice presidente sênior do departamento de imagens avançadas da Panavision, criador da câmera Genesis e responsável pela F900 que foi usada em Guerra nas Estrelas, é um dos verdadeiros gênios da cinematografia eletrônica que tem feito de tudo para desbancar o mito dos 4K.

    Takamoto
    Takamoto
    Fotojornalista, artista marcial, ex-militar, perito criminal.

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