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    Toffoli derruba liminar que suspendia Porta dos Fundos retratando um Jesus gay.

    Toffoli em abril de 2019, valendo-se de um inquérito secreto aberto por ele mesmo, pediu providências ao relator que ele próprio indicou, ministro Alexandre de Moraes, contra uma reportagem em que ele mesmo figurava como protagonista. Acionado, Moraes mandou a revista eletrônica Crusoé e o site O Antagonista retirarem do ar uma notícia que pedia explicações de Toffoli, não censura.

    Dias Toffoli comportou-se como deus, criando a censura em causa própria.  Agora, derrubou a censura imposta por um desembargador do Rio de Janeiro a um filme estrelado por Jesus Cristo gay.

    O presidente do STF Toffoli  avaliou que “uma sátira humorística” não teria o “condão de abalar valores da fé cristã”, como alegado pelo desembargador Benedicto Abicair, do TJRJ.

    Segundo o presidente do STF Toffoli, a liberdade de expressão, condição inerente à racionalidade humana, como direito fundamental do indivíduo e corolário do regime democrático. O ministro ressaltou que a Corte consolidou a plenitude do exercício da liberdade de expressão como decorrência imanente da dignidade da pessoa humana.

    Toffoli disse ainda que o Supremo vetou que “o Poder Público crie de modo artificial seu próprio ensino religioso” ou que favoreça ou hierarquize “interpretações bíblicas e religiosas de um ou mais grupos em detrimento dos demais”.

    A decisão proferida pela Justiça do Rio de Janeiro, a qual mandou retirar do ar o especial de Natal do grupo Porta dos Fundos intitulado “A Primeira Tentação de Cristo”, tem sido criticada por alguns, especialmente pela mídia ligada à esquerda, como um ato de “censura”. Será mesmo?

    Primeiramente é preciso entender o que é censura, de fato. Em segundo, diferenciar o fazer justiça do ato de censura. De forma simples, censura é o ato arbitrário de vetar, privar, proibir, restringir um grupo ou alguém de algo. O “X” da questão está no “ato arbitrário”. O que é isso?

    “Arbitrário” é tudo o que não possui fundamento e, portanto, não está amparado em uma lógica. A censura tem como principal característica a arbitrariedade, pois ela visa os interesses de alguém ou de um grupo, independentemente dos seus fundamentos.

    Imagine você ser impedido de ter acesso a um livro ou filme específico, mas ao questionar o motivo a resposta ser simplesmente um “porque sim”, sem qualquer justificativa lógica fundamentada em fatos. Isso é censura!

    O fazer justiça Toffoli ?

    A diferença da censura para o fazer justiça está no fato de que uma decisão judicial que visa restringir algo está amparada em preceitos jurídicos que visam garantir outros direitos. Isso, porque, a mesma Constituição Federal (C.F) que garante à liberdade de expressão, também condiciona essa liberdade à uma série de direitos alheios.

    São direitos alheios, por exemplo, os direitos à honra, à imagem e ao sentimento religioso. É por isso que ao assegurar “a livre manifestação do pensamento”, a C.F também “veda o anonimato” e assegura “o direito de resposta”, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem (art. 5º, IV e V).

    Ora, entenda a lógica constitucional: a vedação do anonimato tem por única finalidade a identificação dos sujeitos que, abusando da própria liberdade de expressão, podem cometer crimes contra os direitos alheios.

    É verdade que no Título da Ordem Social, o art. 220 dispõe que “a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição”.

    Mas também é verdade que o trecho em destaque está condicionado ao seu complemento, que diz: “Observado o disposto nesta Constituição”. Esses dispostos são justamente os condicionantes da liberdade de expressão e manifestação do pensamento, tais como os direitos à honra, à imagem e ao sentimento religioso, também assegurados pela C.F.

    Não é censura condenar o crime

    Com base na explicação acima está fácil compreender que a decisão judicial que determinou a suspensão do especial da Porta dos Fundos se diferencia da censura, simplesmente porque o tal “especial de Natal” foi enquadrado como um ato de vilipêndio à fé dos cristãos. Portanto, sendo considerado um crime com base no artigo 208 do Código Penal Brasileiro.

    O referido artigo afirma que é crime “escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso“.

    Vilipendiar é o mesmo que depreciar, rebaixar, zombar, escarnecer. É todo ato que tem como objetivo descaracterizar o objeto de culto de forma pejorativa. “Objeto de culto”, por sua vez, pode ser uma simples cruz, a figura de Jesus Cristo, imagem de uma santa ou livro considerado sagrado.

    O mérito do “sagrado” não está no objeto, mas no sentimento religioso transferido a ele. Este objeto pode ser qualquer coisa, desde que seja venerado como sagrado por um sistema de crenças, sendo alvo de culto, ele se torna protegido pela Constituição.

    Não é por acaso, por exemplo, que o abaixo-assinado organizado contra a Porta dos Fundos já está alcançando quase 2,5 milhões de assinaturas. Esse número gigantesco de reações é uma prova contundente de que o sentimento religioso da população cristã foi afetado pelo “especial”.

    Isso porque ao retratar Jesus “gay”, além de envolver Maria e Deus em um triângulo amoroso em um enredo onde a intenção de zombar e descaracterizar os símbolos religiosos é gritante, os membros da Porta dos Fundos ultrajaram publicamente os maiores “objetos” de culto do cristianismo, visto que para os cristãos eles são sagrados, venerados e cultuados.

    Neste caso, não importa o que os membros da Porta dos Fundos pensam, acreditam ou não. Importa tão somente que o que eles pensam e fazem está condicionado ao artigo 208 do Código Penal, o qual tem por objetivo exclusivo proteger o sentimento religioso alheio.

    Foi justamente essa linha de raciocínio adotada pelo desembargador Benedicto Abicair, da sexta Câmara Cível do TJ-RJ, a pedido da Associação Centro Dom Bosco de Fé e Cultura. Ele entendeu que uma vez configurado o crime de vilipêndio à fé alheia, o especial da Porta dos Fundos deve ser suspenso.

    Portanto, isto definitivamente não é censura, mas uma decisão judicial fundamentada nos condicionantes jurídicos que regulam o correto exercício da liberdade de expressão, de pensamento e arte, os quais levam em consideração a necessidade do respeito mútuo e a diferença entre conteúdos críticos e ofensivos.

    Takamoto
    Takamoto
    Fotojornalista, artista marcial, ex-militar, perito criminal.

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